05 dezembro 2009

77 - Mesma hora

Todo o dia, à mesma hora, no mesmo chat, tinham encontro marcado. Trocavam confidências, carícias. Na vida real nunca se viram, nunca se tocaram.

22 setembro 2007

76 - Quatro amigos

O tempo havia passado para os quatro amigos. No café, relembravam os arroubos da juventude enquanto despiam com o olhar as ninfetas que passavam.

02 setembro 2007

75 - Ego

Os problemas de audição nunca o afetaram, seu ego sempre falou mais alto.

74 - Gato preto

No muro de pedra, cantando à luz do luar, o gato preto faz dupla com sua sombra.

73 - Castelo

De sua infância guardou a imagem da neve cobrindo as ameias do castelo. Talvez por isso, ainda acredite que o príncipe encantado vai chegar.

72 - Xale

Envolta em seu xale negro, a fadista, canta de olhos serrados, “fingindo sentir a amargura que deveras sente”.

71 - Convés

No convés, com as estrelas por companheiras, pôs o olhar no horizonte e sentiu que uma nova vida se iniciava.

29 agosto 2007

70 - Galanteios

Maria ficou arrasada, agora não mais ouvia assobios dos peões nas obras, mas sim os galanteios do seu geriatra.

05 setembro 2006

69 - Tarde demais

Já no motel, tarde demais, Luís Gustavo descobriu que seus olhos não eram verdes, seus cabelos não eram dourados, suas unhas eram roídas e a bunda, tão atraente, era falsa.

68 - Na missa

Na missa, os fiéis rezam com fervor para que Dona Maricota esteja com dor de garganta e não possa entoar seus hinos de louvor.

67 - Musa

Achara, finalmente, sua musa inspiradora: sem celulite, sem pneuzinhos na cintura, voz rouca e aveludada. Só um detalhe o incomodava: usarem o mesmo banheiro no restaurante.

17 julho 2006

66 – Sombra

Era tão arrogante, que a própria sombra tinha dificuldade em acompanhá-lo.

65 – Um século

Ele já tinha 70, ela vivia a volúpia dos 30; na cama um século de sabedoria os contemplava.

64 – Frivolidade

Marta não via mais nada à sua frente a não ser a cenoura da frivolidade que norteou toda a sua vida.

02 janeiro 2006

63 - Reveillon

Maria Isabel enviuvara naquele ano. No reveillon não usou calcinhas. Finalmente estava livre!

62 - Sylvias e Florbelas

A tarde correu calma e silenciosa. Lembrou-se de Sylvias e Florbelas. Só não tinha coragem para escrever a mesma história.

61 - Memória

A senhora olhava com avidez à sua volta, como a tentar marcar na retina aquilo que não tinha mais registro em sua memória.

21 novembro 2005

60 – Vítimas

Com ar zombeteiro, o público que deixava o cinema olhava as próximas vítimas à espera na fila.

59 – Beijo roubado

Na tela o galã rouba um beijo da mocinha. Na platéia, Jurema chora a solidão de quem nunca teve um beijo roubado.

58 – Mostra

Não falava árabe, russo, alemão ou chinês, mas sempre que ia a uma sessão da Mostra Internacional de Cinema dava-se ares de poliglota.

02 outubro 2005

57 - Pipoca

Seu João nunca entrou num cinema, porém sabe de cor os sucessos da temporada. Os saquinhos de pipoca vendidos não lhe deixam nenhuma dúvida.

56 - Nunca mais

Era a primeira vez que iam ao cinema. Quis impressionar a garota, escolheu um filme chinês sem legendas. Nunca mais se viram.

55 - Uma idéia

Uma idéia na cabeça. Uma câmera na mão. Uma merda na tela.

18 setembro 2005

54 - Bia

No canto do quarto Bia sentia-se só. Não ouvia canções de ninar, não lhe trocavam a roupa. Ana tornara-se mulher; a boneca não tinha mais importância.

53 - Lulu

A vida de Nadia é caótica. O amante um broxa. O marido um idiota. Só Lulu, seu cão de estimação, sabe fazê-la verdadeiramente feliz.

52 - Sofisticada

Ela é a puta mais sofisticada do bordel, recebe os clientes vestindo apenas uma gota de Chanel nº 5.

25 agosto 2005

51 - Par ideal

Assim como Romeu e Julieta eram feitos um para o outro, eles também formam o par ideal – ela, uma vadia; ele, um corno.

50 - Roupa de domingo

Maria vestiu roupa de domingo. Sentou-se à janela. Esperou pelo príncipe encantado que nunca chegou

49 - Ana

Por um longo momento, Ana olhou-o ali deitado. Percebeu que não havia mais nada a uni-los. Apagou a luz e saiu.

30 julho 2005

48 – Serenamente

O padre perguntou se havia alguém que pudesse impedir aquele matrimônio. Serenamente, Rosa olhou seu buquê. Ah, se os botões de laranjeira falassem!

47 – Ronronou

Quando Lia chegou, seus lindos olhos azuis iluminaram-se. Agora sua tigela de ração ficaria cheia e a caixa de areia limpa. Ronronou aliviado.

46 – Aquele beijo

Desejou aquele beijo com todo o ardor. Mas, quando finalmente aconteceu, soube que nada poderia haver entre eles... Odiava alho!

08 julho 2005

45 – Pela TV

Lídia compra tudo o que a televisão anuncia. Tinha lindos cabelos, até usar aquele novo shampoo. Ontem, comprou pela TV uma nova peruca.

44 - Bordel da esquina

Ela quis matar-se, mas preferiu se mudar para o bordel da esquina. Ele estourou os miolos; não resistiu ao vê-la tão feliz.

43 – Sexta-feira

Sexta-feira. Mesa posta. Na sala, burburinho de vozes e risos. Ele sentou-se na varanda, perdeu o olhar no infinito, e teve a solidão por companhia.

42 – Arthur

Arthur, homem de princípios, ficou à beira de um ataque de nervos desde que a esposa e a amante resolveram formar um novo casal.

41 – André

A vida de André fora uma grande mentira. Quando morreu, adornaram-lhe o caixão com lindos lírios de plástico.

40 – Álvaro

Vestido de bufão, andando de gatas, latindo como cão amestrado, Álvaro, como todo o apaixonado, acha-se capaz de grandes gestos.

06 julho 2005

39 – Formiga Mariana

Domingo no parque. Toda arrumada, com as antenas luzindo, a formiga Mariana faz pose para a fotografia em cima da cesta de piquenique.

38 – Velha avó

No canto da sala, a mesinha com as fotografias da família é agora a única memória da velha avó.

37 - Preliminares

Quando conheceu Marcos, descobriu que não há necessidade de falar sobre semiótica durante as preliminares. Agora tem orgasmos múltiplos.

03 julho 2005

36 – Fleur de Rocaille

Era tão pretensiosa que acreditava piamente que seus peidos exalavam aroma de Fleur de Rocaille.

35 – Novela

Ele sussurrava palavras ternas, ela excitada e vaidosa acreditava. Hoje, sozinha assiste à novela das oito.

34 – Outro corpo

Com orgasmos múltiplos, saudou a tarde que se despedia. Finalmente, encontrara um outro corpo que vibrava em uníssono com o seu.

01 julho 2005

33 – Palco

No palco, dois atores sem talento encenavam um texto sem paixão. Era a arte imitando a vida.

32 – Velhos bordéis

Uma taça de vinho. Um cigarro na piteira dourada, almofadas de veludo, risos, tilintar de cristais... Clara adorava relembrar os velhos bordéis

31 – Candelabro

Iluminou segredos, juras de amor, assistiu a brigas, viu reconciliações. Agora, naquele monturo, o velho candelabro jazia com os escombros da casa.

15 junho 2005

30 – Bandeiras despregadas

A bandeiras despregadas, a platéia ri com as piruetas do palhaço. Só a mulher gorda percebeu que a lágrima em seu rosto não era desenhada.

29 – Luc

A velha sovina morreu. Deixou à irmã o coração, ao irmão o fígado, à prima a córnea direita e ao primo a esquerda. O gato Luc herdou a mansão.

28 – Antecuco

Deu-lhe um dicionário com o verbete antecuco grifado. No dia seguinte leu a manchete: Noivo mata noiva e depois se enforca. Leo não pôde mais dormir.

09 junho 2005

27 – Arco-íris

O velho duende não achou seu pote de ouro. Percebeu que fora enganado, não lhe restou alternativa: roubou as cores do arco-íris.

26 – Desperdício

Naquele final de manhã, quis lançar-lhe uma praga. Mas seria um desperdício gastar com ele tanta energia. Achou melhor comprar um vestido novo.

25 – Convenção

Na convenção anual das bruxas, o grande sucesso foi a apresentação do novo modelo informatizado de vassoura voadora.

24 – Na gaveta

Na gaveta da cômoda, os papéis amarelados pelo tempo, contavam histórias de amor que há muito tinham sido esquecidas.

23 – Reencarnação

No céu, as inscrições para reencarnação foram abertas. Foi a primeira a chegar ao guichê das amantes. Desta vez, não lavaria cuecas por mais uma vida.

22 – Verruga

Naquela galáxia distante a mãe verruga aconselha seu filho a não contar estrelas... Pois poderiam nascer-lhe meninos na ponta do dedo.

08 junho 2005

21 – Hipótese

Há muito não se toleravam, mas a hipótese de um deles ficar sem o gato era a única razão para ainda não se terem separado.

20 – Liberdade

A liberdade estava ali tão próxima. Para alcançá-la, só precisou deixar-se levar pelo vento que envolvia o penhasco.

19 – Garçom

A mulherzinha, na mesa ao lado, era tão desagradável que o garçom não titubeou em lhe trazer a caipirinha temperada pela própria saliva.

06 junho 2005

18 – Vazio

Olhou ao seu redor e só encontrou um enorme vazio. Finalmente, percebeu que na busca por novos amores, não teve tempo para viver um.

17 – Jornal

Levantou-se e foi até a cozinha. Esperou, como era costume, que ela lhe servisse o café. Mas, naquela manhã, só o jornal lhe fez companhia.

16 – Procela

O pescador não voltou à praia. Na procela, seu barco procurou abrigo num rochedo.

31 maio 2005

15 – Fumaça

Atrás da cortina de fumaça, deixada pelo cigarro que fumava, a mulher escondia uma lágrima de tristeza.

14 – Andor

Sua roupa de anjo era linda, tule suíço, arminho francês. Acompanhava o andor em fervorosa devoção. Rezava para que o santo não caísse.

13 – Cortinas

Abriu as cortinas e deixou que a luz do dia visitasse a sala. Agora não estava mais sozinha.

29 maio 2005

12 – Noite estrelada

Sob a noite estrelada, deitou-se na areia e deixou que o mar lhe servisse de cobertor.

11 – Na varanda

O maior divertimento do aposentado era juntar-se ao neto na, varanda, e apostar qual dos dois conseguia acertar o maior número de carecas.

10 – Reflexo

Mais rápido do que imaginara, a velhice tinha chegado. Agora só o reflexo no espelho lhe fazia companhia.

28 maio 2005

09 – Perfeccionista

O músico era tão perfeccionista que naquela tarde, quando seu gato miou uma oitava acima, não hesitou em atirá-lo pela janela.

08 – Terceira dose

Mesmo após a terceira dose, ele ainda continuava a lhe parecer completamente estúpido.

07 – Faltou viver

Já tinha plantado uma árvore, feito um filho, escrito um livro. Triste, percebeu que só lhe faltou viver...

27 maio 2005

06 - Banda

Olhou pela janela e não viu a banda passar.

05 – Toc-toc

Com o toc-toc dos saltos, a vizinha do décimo andar, ainda madrugada, prenuncia a hora da missa dominical.

04 - Vitório

Dona Elvira era tão chata que Vitório, seu cachorro de estimação, precisou ir ao terapeuta para se recuperar da depressão.

26 maio 2005

03 – Velhice

Quando olhou seu rosto no espelho, percebeu que as rugas não lhe traziam a angustia da velhice, mas a certeza de que agora podia dizer o que queria.

02 – Bichano

Estava tão mal-humorada naquela manhã, que pisar o rabo do gato foi a melhor carícia com que o bichano pôde contar.

01 – Madrugada

Na madrugada insone, ela procurava por um lampejo de juventude na cama desfeita.